quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

O travesti da Lavradio e o poema do segurança






Joyce era um travesti conhecido em todo o baixo meretrício da Lapa. Há três anos que brilhava na esquina da Lavradio com a Mem de Sá ,exibindo seus enormes peitos e bunda de silicone. Sua fama extrapolava as fronteiras nacionais e, de vez em quando, apareciam estrangeiros ricos pagando qualquer preço por uma noite com o transformista.
Uma noite, Joyce foi encontrado morto no terreno baldio atrás do prédio que fora uma delegacia. Tinha o corpo todo picado de faca, os pés esmagados e as pontas dos dedos amputadas. Seus colegas desesperaram-se e deflagraram um início de rebelião na área, que hoje é um dos principais pontos turísticos da cidade. A polícia chegou descendo o cacete e, na confusão, outro travesti foi baleado e morreu horas depois no Souza Aguiar.
Dizem que foi essa a situação que levou Antônio Rodriguez, segurança do Carioca da Gema, casa de show na Mem de Sá, a escrever um lindo poema sobre o acontecido. Um amigo de Antônio, que preferiu não se identificar, disse que Antônio era irmão do travesti morto durante a rebelião que se seguiu ao assassinato de Joyce.


Esse texto chegou às minhas mãos da maneira mais fortuita, que não convém revelar agora. Transcrevo abaixo o poema.




A morte e seus olhos tristes


a mancha rubra na parede
foi o beijo odioso da morte
sorriso destroçado
pela dureza do ferro
que reveste a maldade dos corpos


corpo picado de faca
como bruxas a queimar
no fogo frio do preconceito


duas moças turbinadas
de bunda dura e peitos fartos
morreram sem incomodar
a festa da juventude luzidia


ígneo-azul-outrora
que amarga a pizza
suculenta de nosso fracasso


amor morria em mim
como nuvens carregadas
que não chovem sobre a seca


glórias da dor
incendiaram-me os rins
e não tenho ouro
pra destruir o fígado


morreu a explosiva flor
da madrugada intrépida
morreu a outra que me beijava
secretamente no banheiro


deixem-me aqui-lonjuras
observando a queda irreversível
de mim em mim,
nas profundas do inferno
ar-condicionado dos bares de luxo
em que vendo meu sangue
infectado de poeta
por setecentos reais
no dia 30.


Miguel do Rosário


Wanderley Elian


24 comentários:

  1. Nossa, ao ler esse texto realmente é ridiculamente o que é capaz de fazer, eu não sei o que dizer!

    Mas o poema pode perceber que é bem frio as palavras do autor, de pura tristeza imensa, e com certeza indignado;

    Mas essa é a nossa realidade com certeza.
    A sua postagem caiu identico a postagem do paulo, está parecendo que pensaram quase o mesmo objetivo!

    Beijos,
    Boa semana

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  2. Puxa, Wanderlei, que história. Que coisa horrorosa essa coisa de preconceito com pessoas de outra escolha sexual, ou seja lá qual for a opção de vida. Nada temos com isso e se somos livres e exigimos a nossa liberdade, ela deve valer pra todos.
    Lindo poema e emocionante. Beijos pra ti e boa quinta-feira.

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  3. As tragédias em busca da redenção. Muitas mudanças acontecem depois do sangue. O mundo esta cheio desses exemplos, uma revolta surge para que todos caiam em si e faça da vida um palco melhor.
    Bjs.

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  4. Uau,,,que historia terrivel,,,preconceitos,,,coisa que não deveria existir nessa vida,,,somos livres...e uma frase me marcou,,,"o beijo odioso da morte" nossa,,isso é forte....abraçso e um belo dia.

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  5. Wanderley uma história realmente triste , e o poema vem fechar com chave de ouro, muito bem escrito.
    Abraços forte

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  6. Não me sinto após ler o texto e a poesia com vontade de dizer bom dia. Existe violência que usa e abusa de codinome, um deles preconceito, contudo por vezes este ridículo desvio de sentimento e acompanhado de inveja, frustração, covardia. A intolerância hoje nos cerca e não me venham com conquistas e me apresentem soluções e leis que acabem com essa matança de homossexuais, e que por vezes não há esforço policial para resolver, se costuma dizer “ Morreu mais uma bicha, um traveco também quem manda dar o ...”, e assim segue este mundo de diferenças não aceitas, de que o difere nos agride, o não entender na verdade torna essas pessoas ignorantes sobre a vida.

    Renata

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  7. FIM TRAGICO DESSA CRIATUTA PEITUDA ,TBM Ñ SEI PORQUE AS PESSOAS QUEREM TANTO SER O QUE Ñ SÃO!!!
    QUEREM SEMPRE DINHEIRO "FACIL"!!!
    SEI LÁ...MUITO DIFICIL ENTENDER!!!
    BJIM TÈ +

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  8. lastimas da vida, uma dentre muitas pessoas e crianças, certamente inveja neste caso... Acho abominavel a capacidade do ser humanao, matar a sangue frio, os animais iracionais sao mais espertos que os ditos racionais Homo sapiens...

    lastimas que sempre iremos ver neste mundo ja condenado pelas idiotices humanas...

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  9. Oi querido..
    Infelizmente hoje ainda temos que conviver com situações como esta...
    Só tenho a dizer que é lamentável.

    Lindo poema !!
    Bjs

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  10. Olá Poeta!

    Uma história verídica com personagens que amam,sentem e sofrem com a perda.
    A vida e suas escolhas em preconceitos embutidos em mentes que mentem,matam pelo prazer do deboche.
    Infelizmente,o ser humano está muito além do que pensa ser.Está em estado de selvageria em momentos como relata a notícia da morte do travesti.

    Beijos de Luz!

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  11. Que triste realidade meu querido.

    O poema completou a história relatada.

    Beijos.

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  12. Isso é verídico?!? Hein?
    Menino... a linha VacaBeauty estará nos melhores armazéns logo, logo... avisa a prima (a prima, s-e-i... hehehe)!!!
    Estás indicado para um selo lá no blog! Falou!? Hugz!!!

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  13. Quando as bestas se juntam
    para avivar as chamas do preconceito
    não se reconhecem no animal
    irracional…

    Grande post, Wanderley!

    História sempre real! E um poema que conota denotando as notas tristes dessa lira.

    Bjs e inté!

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  14. Wanderley,muito cruel o que fizeram com essa menina!Eu me sinto muito entristecida quando vejo o quanto a maldade e o preconceito ainda dominam o mundo!Poesia linda e muito comovente!Abraços,

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  15. O corpo picado de faca, os pés esmagados e as pontas dos dedos amputadas. Afinal, a(o) Joyce foi vítima de preconceito ou de inveja? Pelo visto, Joyce tinha um belo corpo para a inveja picá-lo de faca. Tinha um belo andar, para a inveja esmagar-lhe os pés e, finalizando, lindas mãos com unhas muito bem feitas, para a inveja amputar-lhe as pontas dos dedos. É lamentável, mas, infelizmente essa é a realidade.

    Belo post meu amigo.

    Abraços,

    Furtado.

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  16. Meu grande amigo Warderley que coisa hein que crueldade, tinha um vizinho da minha avó que era travesti e morreu com um tiro na cabeça, divida de drogas li o poema muito bom mais ao mesmo tempo nos deixa triste por tanta violência
    Abração meu grande amigo e tudo de bom
    Ass:Rodrigo

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  17. Bárbaro, cruel preconceito, matar é a pior coisa, mutilar nem tem classificação.
    Abs

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  18. Wan, querido,

    Que história mais cruel. Infelizmente o preconceito ainda existe e faz parte dos ignorantes...

    Aproveito que estou aqui, para agradecer seu comentário sobre o post que fiz sobro o livro "O filho eterno" e por você ter compartilhado comigo a sua experiência em lidar com crianças Down. Deve ser muito gratificante mesmo acomapanhar a evolução dessas crianças... Eu penso em trabalhar nesta área justamente por isso... O ser humano é fantástico e tem um poder de superação incrível, quando tem todos os recurso ao seu redor.

    Beijo grande!

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  19. Olá WANDERLEY
    Há alguns anos atrás fizeram o mesmo a um trevesti aqui no Porto.
    É pena, mas é o mundo que temos.
    Abç
    G.J.

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  20. Pois é!
    A intolerância, o não reconhecimento do direito à diferença!
    A descriminação e o ódio para com os que são diferentes de nós.
    É essa miopia que vai fazendo do mundo um lugar triste para se viver.
    Um abraço

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  21. Infelizmente nossa realidade é dura, o ser himano não é respeitado, mas deve haver justiça, pelo menos a vida se encarregará de mostrar, paz.

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  22. tsc, intolerância nesse país pe fod...
    As leis nesse país beneficiam os presos e não a nós cidadães.

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  23. Preconceito!
    Hiprocrisia!
    Maldade!
    Seres humanos feitos de tudo e muitas vezes tão irracionais.
    Matam!
    Destroem!
    Morrem sem saber!

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  24. Quantos e quantos casos como esse acontecem. Viram estatísticas somente.
    E o motivo é o que a maioria dos seus leitores diz: o maldito preconceito.Infelizmente.

    Triste, desumano e lamentável.

    Um beijo pra você.

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